Nem sempre as cervejas mais fáceis de tomar são as mais fáceis de fazer!

Antes de entrarmos no tema sobre produção de cervejas, fórmulas de IBU, OG e SRM/EBC, tem algo que vem antes de tudo isso: a escolha da cerveja que será produzida.

Quando as pessoas estão começando no mundo da cerveja artesanal, existem alguns tipos de cerveja que são mais bem aceitos. Até mesmo para quem “não gosta” de cerveja.

As cervejas mais fáceis de tomar

Você provavelmente pensou em Weiss e com todos que converso, essa realmente é a recomendação número 1:

“Ah, mas eu não gosto de cerveja! ”
“Você devia provar uma cerveja de trigo então. ”

As Lagers não ficam de fora nas recomendações:

“Eu já cheguei a provar umas cervejas diferentes, mas não gostei, achei muito forte.”
“Você tem que começar pelas mais fraquinhas, toma uma Pilsen!”

Já chegaram a ouvir isso, ou até mesmo dizer para alguém? Acontece e realmente é assim que se começa. Uma das minhas cervejas favoritas quando entrei para este mundo foi a Witbier Bluemoon.

tipo de cerveja difícil de fazer

Se você está pensando em começar a produzir cerveja por um destes estilos, já te aconselho a repensar na sua escolha por alguns motivos:

Se você estuda para se tornar um cervejeiro caseiro ou até mesmo por simplesmente querer saber mais sobre cervejas, já deve saber que elas são divididas em 2 estilos: Ales e Lagers.

Um brinde à fermentação

Como já foi falado aqui no blog, as Ales têm a chamada fermentação de topo ou “cerveja de alta fermentação” como vem em alguns rótulos. A fermentação desse tipo de cerveja acontece no topo do fermentador e em temperaturas mais elevadas entre 15°C e 24°C.

As Lagers são de baixa fermentação, pois ela ocorre no fundo do fermentador e em temperaturas mais frias, geralmente entre 9°C e 15°C.

A grande dificuldade

A dificuldade nisso, é que nem todo mundo está disposto a desembolsar muita grana para montar seu equipamento de cervejeiro. E como vivemos em um país quente, uma geladeira modificada com um termostato para controle de temperatura pode ser necessária.

Existem, porém, certas leveduras consideradas mistas, que vão gerar uma cerveja de caráter neutro e podem ser usadas para fazer “Lagers” em temperaturas variáveis. Mas isso é assunto para um futuro próximo.

Ah, as cervejas de trigo…

Existem dois fatores principais para que eu tenha criado uma certa aversão a produzir estilos com trigo, vamos falar primeiramente do mais simples:

Filtração

Os dois grãos mais usados em cervejas (que não levam arroz e milho) são cevada e trigo. Como já foi explicado neste post, o malte não é um grão e sim o grão que passou pelo processo de malteação. Por isso temos malte de cevada, malte de trigo, entre outros. Esse processo é vital para a fabricação de cerveja.

Toda cerveja tem que levar pelo menos uma parcela de grãos maltados.

Durante esse processo a cevada mantém sua casca, já o trigo a perde. O que a casca tem a ver com tudo isso? A casca dos grãos é um importante agente filtrante na hora de se produzir a cerveja e uma das coisas mais comuns de se acontecer em cervejas com alta porcentagem de malte de trigo é: entupir o seu filtro. 

Acredite, um filtro entupido não é bonito e não tem solução prática, nem dica, nem reza, nem nada. Você pode tentar jogar um pouco de água, caso tenha outra panela, e assim, dividir a carga e ir filtrando aos poucos.
Para os cervejeiros mais avançados, nível industrial ou semi-industrial, tem como empurrar com CO2 pressurizando a panela de brassagem, mas sinceramente, não é o tipo de coisa que você vai querer lidar no meio de uma brassagem.

tipo de cerveja difícil de fazer

Como evitar a filtração no processo de fabricação de cerveja?

A primeira coisa a se fazer em uma brassagem é: controlar muito bem a moagem dos grãos.

Grãos grossos demais vão fazer com que o seu rendimento seja muito baixo. Já os grãos muito finos farão com que seu filtro entupa (até se você estiver usando somente cevada).

Outra solução para lidar com o trigo é comprar casca de arroz. Atenção: você utilizará somente a casca. A ideia é adicioná-la um pouco antes da filtração, mexer bem e deixar com que ela auxilie na filtragem.

Teoricamente a casca agirá apenas de maneira física na mistura e não vai interagir com seu mosto (termo utilizado para cerveja que ainda não foi fermentada).

E não para por aí.

O trigo pode tirar ainda mais a sua e a minha paciência. Sabe como?

A composição química do trigo é diferente da composição da cevada, por isso ele tem que ser tratado de maneira diferente durante a brasagem. Para que isso aconteça é preciso das rampas de aquecimento.

Rampas de aquecimento

Em uma cerveja, que leva somente malte de cevada, é comum cervejeiros deixarem que a mistura fique em somente duas temperaturas. Uma na faixa dos 63°C até 70°C para a fase de sacarificação, onde as enzimas transformam o amido dos grãos em açúcares que serão fermentados gerando o álcool. Após essa fase, que leva em torno de uma hora, é necessário aquecer a mistura entre 75°C e 80°C.

Normalmente 78°C é para o “Mash Out”, onde as enzimas são destruídas em ordem para darmos continuidade ao processo.

Lembrando que, para o aquecimento, é necessário que a mistura esteja sempre em movimento.

Um novo cervejeiro, quando fizer uma das suas primeiras cervejas, provavelmente mexerá a mistura no braço. Os melhores equipamentos conseguem aquecer em média um grau por minuto.

Então vamos supor que a nossa cerveja esteja a 67°C e vamos elevar a temperatura para 78°C. São 11 minutos mexendo uma panela quente, com vapor na sua cara. No caso de uma leva de 20 litros, teremos neste momento cerca de 4 a 6 kg de grãos dentro da panela, com mais 15 litros de água. Garanto: é pesado e cansa muito!

Certo. Tudo o que expliquei foi sobre uma cerveja “normal”. Agora, uma cerveja de trigo normalmente começa a 50°C para o descanso proteico e, somente depois disso, entramos na fase de sacarificação. Então imagine aqueles 11 minutos sendo transformados em 28 minutos.

Agora imagine você, em um final de semana, fabricando sua primeira cervejinha. Você e seus amigos tranquilos e animados, revezando para mexer as panelas. Depois de algum tempo, vocês já cansados vão filtrar e surpresa! O filtro entope.

Mas fique calmo! Acontece. A cerveja com certeza vai ter um gosto bem melhor depois… ou não.

Não desanime, amigo. Nem tudo na vida é dureza. Semana que vem vou falar sobre as cervejas boas de se fazer!