Sábado

Sábado Bar

Rotina é mesmo uma coisa filha da puta. É tão filha da puta que a gente faz nosso lazer entrar na rotina e a coisa toda perde o sentido. Fazemos porque julgamos que aquilo desopila o dia a dia maçante, mas na verdade mesmo, fazemos porque não temos outra escolha a não ser a rotina. Sim, nossa existência é besta – e de ressaca ela é mais amarga e mais revoltante.

E então, num sábado, como sempre, saio de casa enquanto a mulher faz faxina e prepara o almoço – que também entrou na rotina, mas ela ainda não sabe – e sento pra tomar uma no bar enquanto espero o carro sair do lava rápido. Mesmo garçom, mesma cerveja, mesma cachaça e mesmo petisco. Papo trivial pra quebrar o gelo enquanto o garçom me serve. Mesma coisa. Um cumprimento ao dono do bar lá atrás do vidro do caixa, coberto por maços de cigarro. Mesma coisa. Até a ordem de beber as coisas – mesma coisa. Dois goles, um bico na cachaça, cigarro aceso e tempo passando.

Chama o garçom, pede mais uma, dois ou três comentários sobre nada e segue. Garrafa esvazia, garrafa cheia chega. Copo de cana esvazia, copo de cana enche. Torresmo acaba. Hora de ir pegar o carro. Pego o carro, paro em outro bar, encontro os três mesmos amigos, falo das mesmas coisas, rio alto, começo a olhar pras meninas que chegam pra passar a tarde bebendo e rindo e me lembro que já é hora de voltar pra casa, afinal, o almoço deve estar pronto – já são três e meia da tarde. Hora da saideira. Outra saideira. A conta. Uma saideira por conta da casa? Sim.

Cinco e meia da tarde. A mulher derrotada no sofá da sala sob o ventilador nem se manifesta quando eu entro em casa. Jogo a chave do carro em cima da mesa, guardo a carteira e o maço de cigarros dentro da gaveta do móvel da sala, passo no banheiro e mijo escandalosamente, aliviado. Lavo a mão e a cara. Não ouso dizer nada pra ela. Na cozinha, tiro as panelas da geladeira, monto um prato fenomenal e enfio no microondas. Os três minutos são suficientes pra me fazer cochilar enquanto espero.

Encho um copo bem grande de refrigerante. Pano de prato na mão pra segurar o prato e vou pra sala pra almoçar. Ela, ainda deitada, cochila vendo o programa daquele narigudo judeu feio pra cacete. Como e deixo o prato na mesa do abajur ao lado do sofá. E é a conta pra arrotar alto, fingindo ser sem querer, e perfumar a sala com um cheiro impagável de geladeira. O cachorro espirra. Eu rio de lado e, antes de conseguir peidar, durmo.