Eu já estava lá sentado há algumas horas quando ela finalmente apareceu. Estava com o rosto avermelhado, um ar esbaforido, respirando depressa. Olhou pra mim e fez cara de nada. Deve ter reparado nos dois copinhos de dose de Seleta já vazios. Ela insiste em dizer que não gosta que eu beba e eu insisto em dizer que não há o que fazer sobre isso.
Levantei e dei-lhe um beijo. Ela encostou a cabeça no meu pescoço e beijou minha nuca. Sentou-se. Pediu um copo pro garçom e me olhou. Os olhos cansados e tristes.
- O que houve?
- O de sempre. Não aguento mais. Acho que preciso largar tudo, sair daqui, desse emprego, dessa vida.
- De mim.
- Não. Você pode continuar.
- Eu não sei se devo. Acho que você se prende aqui demais e isso também é problema meu.
- Não, estou dizendo. Você não precisa sair. Quem precisa sair sou eu.
O garçom trouxe o copo e uma cerveja cheia. Esvaziou a garrafa nos dois copos e colocou a nova na camisinha. Saiu e ela continuou.
- Estou me sentindo muito mal comigo mesma. Me sinto infeliz e incompetente. Não sou boa no que faço.
- Baby, você é um arregaço em tudo o que faz. Principalmente na cama.
- Estou falando do trabalho.
- Deixa essa porra pra depois. Precisamos dele, eu sei. Eu preciso mais do seu emprego que você, na verdade.
- Você está aqui porque eu vim.
- Eu estou aqui porque eu quero.
Encho o copo. Ela me olha. Dou um gole longo e esvazio tudo. Ela pega a garrafa e se serve. Peço outra Seleta.
- Para de beber. Amanhã ainda é quarta.
- Amanhã será sábado.
- Sábado?
- Sim. Perdi o emprego, honey. E foi por isso que cheguei tão cedo nessa merda de bar e já tomei isso tudo aí de pinga.
- Puta que pariu!
- Preciso mais do seu emprego que você.
- O que a gente faz?
- Simplesmente segue adiante. É o que fazemos?
- Mas eu não aguento mais!
- Ok. Podemos voltar e tentar de novo em São Paulo…
- Não! Eu não quero voltar pra lá.
- Nem eu, então o lance é seguir adiante. Eu me recoloco.
- Você não tá afim de se recolocar…
- Não estou. Eu queria passar o dia aqui sentado, com o notebook no colo, escrevendo sem parar pra sempre.
- E quem vai bancar isso tudo?
- Eu preciso mais do seu emprego que você, baby.
- Você é um filho da puta!
- Eu sou. Um maldito filho da puta que escreve alguns bons versos e cadernos inteiros de merda.
- Eu te amo.
- Eu também te amo, baby.
Estico o braço. O garçom se aproxima e ela belisca meu braço assim que peço outra Seleta.
Este conto faz parte da série de publicações escrita por Aldo Jr, na editoria Mesa de Bar.